Chorar

Publicado no livro Figos maduros, Editora Literalis, em Janeiro/2010
“Não fazia questão das lágrimas, ainda não carregava lenço no bolso para secá-las” (Sander, 2005).
Nascemos e, no contato com o novo mundo, choramos. Pais e médicos adoram ver o recém nascido chorar. É a forma de reagir, de protestar contra a nova situação, e também de mostrar que chegou lindo e forte.
Vamos crescendo e, ainda bebês, usamos o choro para reclamar com sinceridade. Fome, sede, dor, ausência. É choro pra valer. De verdade mesmo.
Uma criança, quando chora ou ri, está demonstrando seu sentimento mais verdadeiro. Mais puro. A inocência não sabe dissimular. Por isso, na bienal, ela irá preferir o colorido, o alegre, ao preto e branco, ao triste.
Mais tarde, adolescente, nosso choro e nosso riso começam a perder a inocência. Deixamos de ser autênticos e fingimos. Passamos a chorar para representar, para enganar, chamar atenção. Aprendemos, com os adultos, a não sermos verdadeiros 24 horas por dia. Anos mais tarde, tentamos voltar à verdade fazendo terapias.
“Como os da esquina da casa dele, cheios de balas e chocolates, carnes e verduras, ou como aquele cheio de sonhos.” (Sander, 2005).
Pela vida a fora, choramos a dor física, mas o que mais dói é a dor da traição.
Choramos de fato, também de fingimento.
Choramos verdades e choramos mentiras.
Nem só para secar o pranto usamos lenço de bolso, também serve para esconder as vergonhas. As fraquezas. Os risos malvados dissimulados.
Choramos em cada esquina por balas e chocolates. Nas casas pobres, choramos por leite, carnes e verduras, que faltam à mesa. Choramos nossas realizações e principalmente os sonhos perdidos a cada armazém do cais da vida.
E por fim, de verdade ou não…
Choramos a morte.

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